Lembro quando eu ia pra feira central aqui da minha cidade com minha mãe e me sentia importante por conseguir carregar uma sacola cheia de frutas. Sem falar nos pirulitos que se chamavam "galinha de açucar" e tinha um jeito único de desmanchar na boca. Nunca, nunca mais eu experimentarei aquele gosto de novo, eu sei. Gosto de infância é irrecuperável.
Estes dias eu tive de voltar à feira, sozinha, para fazer uma surpresa à dona minha mãe. Foi inexplicável a sensação de agora conseguir carregar muito mais do que a sacola de frutas: carregava sentimentos de saudade boa, desses que dá pra encher um balaio e ainda levar troco.
Como homenagem, vai um poema INÉDITO (favor - e quando eu digo por favor é quase "pelo amor de Deus" - respeitar os direitos autorais *)
Sento na feira e observo:
Que cada cento tem mil histórias
De lavoura e de louvores
Que cada troco tem sua troca
De olhares e mercadoria
Que cada acento teu seu dono:
Seu Zé da Bodega e Margarida das Flores
Nem os sábios, nem os bêbados
Haveriam de compreender
Tanta delicadeza na grosseria
Tanto brilho em pedra bruta
Tanta luta disfarçada de freguesia
Mão que colhe feijão, acolhe menino
Boca que grita promoção, engole quentinha
Pé que anda na lama, vende azaléia
Sorriso sem dente, morde rapadura
É tanta cor cheirando sensações
que em algum momento embrulha tudo:
O estômago, a galinha e o presente de tia
A pimenta apoquentando o passado
Enquanto a pinga entonteia o futuro
Na roda da carroça, o presente se arrasta
O tempo é freguês antigo: não paga, não apaga
Não leva, nem se eleva. É enlevo.
Eu tenho é medo de falar da feira
E minhas memórias não agüentarem
Saírem pulando por tudo que é puleiro
Se empirulitando de vez pra minha infância
E de lá não sair por mais que eu pelejasse
Imaginem só eu ter de conduzir
No pingo do meio dia, meu suor mais sagrado:
Um balaio cheinho de lembrançarias impagáveis
Samelly Xavier, recordando - já que recordar significa "voltar ao coração"
* Respeitar direitos autorais, pra quem não sabe é:
1- Utilizar o poema ou qualquer trecho dele citando a autora e o local original de publicação (livro ou site)
2- NÃO MODIFICAR o texto original.
(Sei que parece pedantismo essa história de enfatizar sobre os direitos autorais, mas, infelizmente, já aconteceu várias vezes de eu ver textos meus circulando por aí sem autoria, ou modificado, ou como se o autor fosse outra pessoa. E isso não é apenas chato ou absurdo. É dizerem pra você que seu filho é de outra mãe.)
10 Comments:
Lindo o texto novo.
Obrigada
Poxa, tu ja tem cara de feira, de bagunça! Daquela farra que valoriza esforço sobrevivencia e mesmo assim contempla o bom vida, revelando uma infinitude cores, cheiros e sensações!
Eu tb adoro feira, principalmente na melhor de uma companhia como vc!
Convido tu a uma visita na feira na proxima ooportunidade que estivermos proximos!
Adorei a valorização pelo esforço no ganho da vida com o melhor dela que é o SORRISO!
Adhoro o talento da minha amiga escritora
Muito lindooo!
Lindo texto, vc tem uma sensibilidade que admiro e tenho: A de perceber que cada pessoa tem sua história e que, em cada uma dessas pessoas a um mundo fascinante!
ass: Lion, Seu novo leitor :)
QUE LINDO :~
É impressionante a capacidade que essa mulher tem de prender a nossa atençao aos textos por ela produzidos.
Vc me inspira capacidade!!
Nossa, eu fiquei super feliz com o verso. Mas fiquei contente mesmo foi em descobrir outra pessoa que, como eu, adora feiras! rs
Beijinho, moça.
Será que um da me canso de dizer que sou sua fã?
Adorei os versos, Sameeee!
E aquela bagunça arrumada da feira me inspira tanta familiaridade e paz... Gente metida a chique nunca entenderia! kkkkkkkkkkkkkkkk xD
Bjoamotu :*
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